projet personnel de photographie liée à l'écriture (chronique).

bâtiment photographié: Sesc Pompeia - São Paulo, Brésil.
architecte: Lina Bo Bardi.
année de réalisation: 2022.
chronique en portugais:
essa semana um baile de 3ª idade me deixou inspirada como há tempos não ficava. não o fotografei, mas escrevi. vem ler?

14 de setembro, sozinha no Sesc Pompeia para um rolê fotográfico. Houve um baile da 3ª idade às 17h. São 18h52 e estou sentada no salão onde aconteceu o baile tomando uma sopa de lentilha, pro orgulho da minha senhora interior, e contente pela sopa que custa somente 10 reais. Eu cogitei participar do baile e fotografá-lo, mas preferi aproveitar a última hora de luz do dia (chuvoso, mas ainda assim) para registrar as áreas externas e tudo o que pensou Lina, afinal, foi para isso que eu vim. Perdi o baile, mas tudo bem. A sopa às 18h52 me transportou para a casa da minha avó. Faça chuva ou faca sol, goste ou não goste o convidado, tem sopa no jantar. Vários idosos continuaram no salão depois do baile. Na mesa ao lado da minha estão cinco senhorinhas que tomaram a mesma decisão que eu, e cada uma desfruta da sua cumbuca quentinha com torradas e temperada com uma boa conversa, aparentemente. Parecem amigas. Ou conhecidas? Teriam acabado de se conhecer no baile? Minutos atrás, no banheiro, uma outra senhora me perguntou se eu era uma das dançarinas. Ri com a pergunta e respondi que não, que estava só de visita, e perguntei se haveria algum espetáculo. "Não", ela respondeu, "uma das dançarinas do baile da 3 idade", e a sua amiga acrescentou: "você se parece com uma delas". Perguntei o que acharam do baile. "Bom demais, queria poder vir sempre". 
Observo de rabo de olho as cinco senhorinhas tomando sopa ao meu lado. Tento ouvir a sua conversa e captar o teor da fofoca da 3ª idade. Aparentemente elas também gostaram do baile, comentam os acontecimentos animadas. Quero fotografá-las, mas não me atrevo, estou muito perto e não quero incomodar. Por isso escrevo, para registrar de outra forma a minha curiosidade. Ademais, me faz bem o exercício, faz tempo que não me meto com as palavras, por preguiça, por cansaço, por medo do que vou encontrar quando começar a colocar em ordem os pensamentos, mesmo quando acho que deveria voltar a fazê-lo para o meu próprio bem. Lembro da Duda e das amigas idosas que ela conheceu no aniversário do padre da igreja do seu bairro, e com quem ela reza um terço toda quinta às 7 da manhã. Sempre achei engraçada essa história, mas agora entendo o que a levou a fazer amizade com essas mulheres de mais de 70 anos. "E agora, encarar um metrô pra zona L?" ouço uma uma delas perguntar às outras. Quero sentar-me com elas e puxar assunto, saber de onde se conhecem, descobrir o seu contexto que deve ser tão diferente do meu, sorrir e deixá-las pensando "O que raios levou essa mocinha a querer se sentar com a gente?" Bom, pura curiosidade. Como pode a gente querer saber tanto da vida dos outros? Hoje em dia me interessa mais a vida alheia do que histórias de ficção ou qualquer assunto sério. "Que fútil!" Pensaria a helena de 10 anos atrás. Felizmente a helena de hoje já deixou alguns julgamentos no passado, e já não vê mais maldade na fofoca, antes palavra pejorativa. Talvez seja a fofoca que mantém o laço dessas senhorinhas. Depois de quase uma vida toda de acontecimentos, deve ser incrível ter tanta coisa para comentar e para ouvir. 

"Pontos suspensivos", escreveu Nicole sobre os estranhos que a rodeiam no cotidiano, em um dos seus textos que eu mais gosto. Esse texto me veio à memória agora como se estivesse diante dos meus olhos. Também não quero deixar de olhar, Nic. Não quero deixar de olhar cada milésimo de segundo, cada instante que passa na minha frente, e até os que não passam. Ultimamente eu tive alguns pensamentos sobre querer viver para sempre. Talvez por isso eu fotografe. Talvez por isso eu guarde centenas de arquivos em um HD, esperando me reconectar com eles novamente em algum momento da vida. Talvez por isso eu esteja curiosa sobre as idosas conversando com tanta vivacidade, pois no fundo eu sei que tenho medo de envelhecer (apesar de brincar que tenho uma senhora interior), de não enxergar mais, de não ter nada de interessante para falar e para ouvir, de não dar conta de fazer as trilhões de coisas que invento de fazer ao mesmo tempo. E também tenho medo de estar desperdiçando a minha juventude com essas trilhões de coisas, e sinto que tudo está passando rápido demais.
É estranha a sensação de ter esses medos confrontados ao ver, pela conversa das idosinhas, que a vida continua, sim, interessante. E de concluir que não importa o tempo que passe: sempre haverá mais um baile, e a minha curiosidade seguirá me levando a olhar e a interagir com tudo ao meu alcance, e a registrar isso como for possível. Talvez eu realmente seja uma das dançarinas do baile da 3ª idade. E espero seguir, como canta Izal: "bailando hasta que todo acabe".
El baile. 🧡

Para matar a curiosidade dos fofoqueiros como eu:
Lina é Lina Bo Bardi, arquiteta do Sesc Pompeia
Duda é Duda Vilela
Nic é Nicole Pretell
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